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quarta-feira, abril 16, 2008

Percepção e realidade: a ilusão do preço alto


Estudo com aficionados de vinhos revela: quanto mais caros os rótulos, mais os consumidores gostam deles. (Álvaro Oppermann).


Uma das disputas mais encarniçadas entre os enólogos é se fatores psicológicos influem ou não na avaliação de vinhos. Bem, talvez o estudo recente da escola de negócios da Universidade de Stanford e do Instituto de Tecnologia da Califórnia (CalTech) não sirva para descrever um Robert Parker, mas deve ter aguçado os sentidos de pelo menos alguns responsáveis pelo marketing do mais nobre dos líquidos aos mortais comuns.



A pesquisa descobriu que o preço da etiqueta na garrafa de vinho influi na sensação de prazer advinda da degustação da bebida.
"Nós descobrimos que o preço não é apenas uma inferência de qualidade, mas sim um elemento que afeta de forma real a experiência da degustação", diz o indiano Baba Shiv, professor de marketing de Stanford e coordenador da pesquisa (também apreciador de bons rótulos, hábito adquirido ao se mudar para a Califórnia).


O preço afeta de maneira real o gosto da bebida, aponta estudo de Stanford
Na pesquisa, foi monitorada nos participantes a área do cérebro que experimenta o prazer, nos córtices medial e frontal. Foi-lhes dado o mesmo vinho para beber, porém com etiquetas de preço diferentes, de US$ 5 e de US$ 45. Na hora e na vez do cálice supostamente mais caro, essa parte do cérebro tornou-se mais ativa nos pesquisados. Segundo Shiv, a experiência prazerosa advém não apenas de dados concretos (como o sabor), mas também da expectativa formada a priori sobre a experiência (algo que um preço superior indicaria). Não por coincidência, numa pesquisa anterior de Shiv, feita com drinques energéticos, os participantes que pagaram o preço integral da bebida tiveram mais facilidade de resolver testes do tipo quebra-cabeça do que os participantes que compraram os drinques com desconto.



Alguns anos atrás, o professor de psicologia cognitiva Frédéric Brochet, da Universidade de Bordeaux, conseguiu confundir a avaliação de 54 especialistas franceses entre vinhos brancos e tintos, ao utilizar corantes inodoros nos brancos. "O cérebro é supereficiente", diz Shiv. "Existe uma sincronia perfeita - e uma sobreposição - entre a sensação em tempo real e a antecipação da sensação no cérebro, que age como um sistema de navegação, um GPS", observa Baba Shiv.
Foram recrutados 11 voluntários para a pesquisa - todos do sexo masculino, além de entusiastas de vinhos tintos -, que receberam a missão de degustar as bebidas, feitas de uvas Cabernet Sauvignon. Apesar de apenas três vinhos serem distribuídos na degustação - cujos preços reais eram US$ 5, US$ 35 e US$ 90 - os pesquisadores introduziram duas etiquetas falsas na pesquisa, fazendo com que o suposto número de bebidas crescesse para cinco. Dois exemplares do vinho mais barato foram servidos, com etiquetas de US$ 5 e de US$ 45. O procedimento inverso foi adotado com a bebida mais cara, que recebeu também uma etiqueta de US$ 10. Os rótulos permaneceram ocultos aos participantes. Entre as degustações - feitas em ordem aleatória -, foi servida água mineral.


O resultado da pesquisa talvez entre para o anedotário da enologia. Todos os participantes puderam sentir diferenças entre os cinco cálices servidos, classificando como melhor o vinho de US$ 90 e, em segundo lugar, o de US$ 45 (na verdade, uma garrafa de US$ 5). Todos os participantes tiveram um aumento de atividade cerebral diante das etiquetas maiores.
Qual o impacto dessa pesquisa para a indústria vinícola? Shiv sorri: "Não dá para saber se essa experiência pode ser reproduzida com experts, mas o meu palpite é que sim. Espero que eles tomem parte".



Negocios Edição 14 - Abril de 2008

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