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segunda-feira, julho 19, 2010

O milagre de São Joaquim

Certas histórias parecem criadas com o propósito de desacreditar governos. Não é o caso desta. Aconteceu em São Joaquim, na serra catarinense. Nos idos de 1980, a estação local da Secretaria da Agricultura decidiu erradicar todos os vinhedos experimentais que mantinha e proibir novos plantios. Os técnicos enfim jogavam a toalha, após anos sucessivos de frustrações, possivelmente por estar o lugar muito exposto a geadas precoces. E seria esse o ponto final do projeto vitivinícola na região se umas poucas videiras de Cabernet Sauvignon, poupadas da erradicação, não fossem, tempos depois, encontradas pelo pesquisador francês Jean Pierre Rosier. Ele vinificou alguns cachos e produziu um ótimo vinho, que foi provado pelo então governador Esperidião Amin, numa visita a São Joaquim, em 1999. O mandatário se agradou tanto que, no ato, reativou as pesquisas e o cultivo de viníferas no território serrano.

José Eduardo Basseti brinda o final da história com um Primo Cabernet Sauvignon 2008, há duas horas no decanter afinando aromas e amaciando texturas. Trata-se, como o nome diz, do primeiro tinto feito pela Villaggio Basseti, vinícola que ele possui em sociedade com seus dois irmãos, Marco Aurélio e Cesar Juliano, todos curitibanos. Atual presidente da Associação Catarinense dos Produtores de Vinhos Finos de Altitude, a Acavitis, José Eduardo fala com entusiasmo do milagre de São Joaquim. Bastou uma década para que a região se firmasse como nova fronteira do vinho nacional.

O grande trunfo é o clima. Os vinhedos se distribuem por altitudes entre 900 e 1.400 metros, zonas de invernos severos e temperaturas baixas (média anual de 13 graus). Estações bem definidas, com pouca chuva no verão, durante a colheita, contribuem para o amadurecimento lento e equilibrado das frutas. E os solos também ajudam. Pedregosos, de baixa a média fertilidade, favorecem o enraizamento das vinhas. A topografia, acidentada, montanhosa, permite a boa drenagem, mas às vezes cria dificuldades. Muitos parreirais estão sendo implantados como se faz no Douro português, nos degraus escavados pelas encostas, amparados em muros de pedra.

Além de São Joaquim, a área vitivinicola da serra catarinense abrange os municípios de Campos Novos e Caçador. Soma 300 hectares de vinhedos, com destaque para as castas Cabernet Sauvignon, Merlot, Sangiovese, Malbec, Pinot Noir, Chardonnay e Sauvignon Blanc. Entre as 32 vinícolas instaladas, a Villa Francioni é referência, com tintos e brancos que a cada nova safra crescem no conceito do mercado. Foi criada pelo empresário Manoel Dilor de Freitas, dono da Cecrisa, que não chegou, contudo, a vê-la concluída. Faleceu em fins de 2004, tendo seus filhos assumido o projeto.

Quando os irmãos Basseti chegaram à região, por volta de 2005, as terras ainda eram baratas, cerca de R$ 900 o hectare. Os vinhedos e outros empreendimentos ligados à fruticultura multiplicaram por dez esse valor. Junto com eles, outros empresários paranaenses lá se instalaram, como Luiz Fernando Carvalho, Caio Pisani e Agostinho Ermelino de Leão Júnior. A Villagio Basseti cultiva oito hectares das castas Cabernet Sauvignon, Merlot, Pinot Noir e Sauvignon Blanc, com produtividade controlada, para a obtenção de frutas de alto padrão. Os vinhos estarão no mercado a partir do próximo ano. Do Primo Cabernet Sauvignon foram feitas apenas 500 garrafas pelo sistema girolate (as etapas de elaboração acontecem dentro de uma mesma barrica giratória), que proporciona caldos de intensa estrutura e extração.

José Eduardo assumiu a Acavitis no ano passado, já contabilizando dois êxitos: a participação dos catarinenses na Expovinis, a grande feira do vinho realizada em São Paulo, e a visita, em novembro próximo, da inglesa Jancis Robinson à região. Critica graduada com o Master of Wines, Jancis é uma das mais influentes personalidades do mundo do vinho. O produtor está esperançoso, enfatizando o apoio que a classe tem recebido da Empresa de Pesquisas Agropecuárias de Santa Catarina, a Epagri. O que está acontecendo em São Joaquim merece uma visita, ele diz. A bela região fica apenas a 420 quilômetros de Curitiba, por estradas pedagiadas em boas condições - a BR 270 (duplicada, via litoral) ou a BR-101 (pista simples, pelo interior).
Fonte - Paraná Online

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